É excelente notícia a perspectiva de aprovação, pela Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 29/2007, que unifica a legislação da TV paga no país, abre o mercado à participação das operadoras de telecomunicações e cria cotas de proteção ao conteúdo nacional.
Afinal, há mais de dois anos o tema vem sendo discutido no Congresso, e o atraso na aprovação desse projeto tem reflexos no avanço da convergência tecnológica no país, na falta de popularização da TV paga, ainda limitada às classes A e B, e até no represamento de investimentos privados em redes de telecomunicações mais modernas, como a de fibra ótica.
Tão ou mais importante do que isso é o fato de o PL 29 abrir novas redes para a distribuição de conteúdo audiovisual nacional, ampliando os canais de acesso para os produtores independentes, hoje, restritos ao funil de entrada dos controladores do mercado.
Um avanço importante na valorização do audiovisual nacional é a política de cotas obrigatórias de exibição de audiovisuais nacionais com garantia de espaço para os produtores independentes, que deve ser aliada ao fomento à produção por meio da transferência de 11% dos recursos do Fistel (fundo de fiscalização das telecomunicações) para o Fundo Nacional do Cinema.
Embora tenha recuado na política de cotas, o relator atual do PL 29 na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, deputado Paulo Henrique Lustosa (PMDB-CE), conseguiu produzir um texto mais simples e objetivo e, assim, obteve consenso entre os segmentos envolvidos -operadoras de telecomunicações, radiodifusores, empresas de TV paga e produtores nacionais de conteúdo audiovisual.
O projeto, que deve ser votado na Comissão neste mês, também tem o mérito de enterrar a pretensão dos radiodifusores de transferir seu modelo de negócios para a Internet. As regras estabelecidas para a TV paga são as mesmas, independentemente da rede utilizada (cabo, transmissão por rádio, por satélite, Internet).
Construído o consenso em torno do tema, é fundamental, agora, que a tramitação do PL 29 seja acelerada na Câmara e que ele chegue ainda este ano ao Senado.
Embora 2010 seja ano eleitoral, a aprovação do texto tem que fazer parte da lista de prioridades do governo e da base aliada.
Portanto, se não houver tempo hábil ainda em 2009, sua aprovação deve acontecer na abertura dos trabalhos legislativos do ano que vem.
É preciso entender que o PL 29 não é bom só para as telefônicas, que vão poder operar no mercado de TV a cabo do qual estão alijadas.
Representa um passo, não decisivo, mas importante, em direção à democratização da distribuição dos conteúdos audiovisuais no país.
E isso é importante não só para a cultura, mas para a democracia. Representa uma cunha nos monopólios de distribuição filmes, documentários e outros produtos audivisuais.
E vai permitir a popularização da TV paga, com a queda do preço das assinaturas, em função da concorrência. Hoje, o Brasil conta só com 6,9 milhões de assinantes.
O fato de o relator do PL 29 ter eliminado as restrições na Internet propostas pelos radiodifusores não significa que o tema tenha saído da pauta dos donos de emissoras.
Trata-se de uma pretensão que, longe de proteger a cultura nacional como justificam, vai cercear a liberdade na rede. A Internet, ao contrário do espaço radioelétrico utilizado para radiodifusão, não é um bem escasso.
Não tem barreira de entrada. Quem quiser produzir um site ou um blog pode fazê-lo, sem pedir licença a quem quer que seja. Assim, o problema não é de acesso, mas garantir a audiência.
Por isso, temos que estar atentos contra todas as iniciativas de controle da Internet, que precisa é de uma legislação que garanta os direitos do cidadão.
E esse marco legal, colocado em consulta pública pelo Ministério da Justiça, tem de assegurar a privacidade, a liberdade de comunicação, o acesso universal, a neutralidade da rede (ou seja, seu tráfego não pode ser limitado), para que a Internet continue sendo um espaço global libertário.
José Dirceu, 63, é advogado e ex-ministro