Ao publicar no último domingo (13/9) uma editorializada reportagem sobre os avanços que o governo federal tem planejado para alguns setores da economia, o “Estadão” entrou no segundo round do vale-tudo eleitoral que pretende encampar até o resultado das urnas em 2010.
Como era de se esperar, o texto foi base para um editorial, “Rumo à Centralização”, publicado na terça-feira (15/9).
No domingo anterior, o jornal já havia se autoescalado para organizar o discurso da oposição, ao tratar em editorial, de forma rasteira, a política fiscal do governo e os investimentos feitos na recuperação das instituições estatais, como a Previdência, por exemplo.
A segunda etapa de ataques se veste com a roupagem moderna do liberalismo ultrapassado pelos fatos históricos recentes.
Diz o jornal, na reportagem “Política de intervenção estatal vai do pré-sal à mineração e eletricidade” (Economia, B-1 e B-4), que “o governo tem aumentado sua presença em outros setores, como eletricidade, fertilizantes, crédito bancário e transportes”, em uma intervenção que constitui “retrocesso”, especialmente “nos setores elétrico e de transportes rodoviários”.
Frente às medidas tomadas pelo governo, que readequou o Estado, dando-lhe um novo papel no enfrentamento de crises econômicas internacionais, o discurso agora é o de que a agenda é estatizante e nacionalista.
Pois foram justamente as ações nas áreas econômica e social que evitaram que o Brasil quebrasse diante da crise que se abateu sobre o mundo. Êxito que a fórmula neoliberal encampada pela atual oposição e abraçada pelo “Estadão” não conseguiu.
É bom lembrar, aliás, que o mundo reconheceu na crise a importância do papel estatal na indução da recuperação. Com bases sólidas estruturadas há anos, o Brasil revelou-se um dos últimos países a ingressar na crise e dá sinais de ser um dos primeiros a sair dela. E mais forte.
Há poucos dias, o G-20 ameaçou retirar a ajuda do Estado, mas voltou atrás. E o Brasil, aliado a outros emergentes, como China e Índia, teve importante papel nesta decisão.
O jornal tenta, mas os próprios textos revelam a inconsistência das críticas. Um dos alvos é a criação de uma agência reguladora do setor de mineração.
Ora vejam: a regulação, tão exaltada pelo “Estadão” e por tucanos como FHC e José Serra! Mas o que se lê é a instituição de prazo para exploração após a concessão dos alvarás, o que inibe o uso das autorizações para especular, e que haverá aumento no valor dos royalties para investimento no Fundo Social. Tratam-se de medidas positivas, e não de retrocessos!
No caso do setor elétrico, salta aos olhos o viés editorializado da reportagem. Primeiro, ao sonegar a informação de que as próprias empresas disputam a parceria em consórcios com a Eletrobrás e os empréstimos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Segundo, ao falar sobre os investimentos da Eletrobrás no exterior, o que deveria ser saudado como sucesso vira tentativa de estigmatização.
Mas os absurdos não param aí. O texto sobre o setor de transporte interestadual e internacional de passageiros por terra informa que haverá “enquadramento” pelo governo federal, mudando o regime de exploração das linhas, a partir de licitação. O “enquadramento”, contudo, é atendimento a exigências do MPF (Ministério Público Federal) e do TCU (Tribunal de Contas da União).
Para completar, chega a ser ridículo afirmar que se trata de intervenção estatal o que o governo planeja no setor de fabricação de fertilizantes. O que foi feito é uma ação corriqueira de substituição de importação num setor em que o Brasil domina a tecnologia.
Sem falar que o país tem uma das maiores reservas e petroquímicas do mundo. É de se elogiar que o governo exija da Petrobras e da Vale investimentos no setor. Por essa razão, tomou-se a decisão de não permitir a venda de uma associada da Petrobras para uma empresa canadense.
Todas essas ações do governo permitirão ao Brasil ter um setor forte de energia e uma mineração que não se esgote na exportação de minérios. A falácia grosseira do jornal evidencia o desprezo que tem esse setor atrasado da sociedade por um Estado que estimule o avanço econômico e reduza as desigualdades sociais.
Foram as ações do governo Lula que devolveram ao Estado brasileiro essa capacidade de gestão eficiente, a partir do planejamento.
Os ataques publicados constituem, assim, tentativa pueril de impedir a continuidade de projeto de desenvolvimento nacional que temos colocado em prática. Como um grito de desespero frente aos novos tempos.
José Dirceu, 63, é advogado e ex-ministro da Casa Civil