No esforço de delinear um perfil de nosso país e nossa gente, em seu livro O povo brasileiro, Darcy Ribeiro conferiu igual atenção a duas dimensões geográficas fundamentais: a nacional e a regional. Assim, ao lado de uma interpretação geral do caráter do Brasil e dos brasileiros, ele apresentou o que seria, em sua visão, cada um dos brasis regionais: o crioulo, na faixa litorânea do Nordeste; o caboclo, na Amazônia; o sertanejo, no agreste nordestino, caatinga e cerrado; o caipira, em São Paulo e Minas; além dos brasis sulinos: povoados por gaúchos, matutos açorianos e gringos, esses últimos provindos do continente europeu.
Constitutivos de uma brasilidade abrangente seriam, por um lado, os traços comuns de uma etnia neobrasileira, distinta da portuguesa, africana ou indígena, responsável por nossa conformação como um “povo novo”; por outro, um destino socioeconômico, compartilhado pela maioria, de exclusão e miséria.
Por sua vez, cada Brasil específico seria uma ilha, em virtude do significativo isolamento em relação aos demais e das peculiaridades de seu subsistema produtivo e sociocultural.
A princípio lentamente e, a partir de meados do século 20, em ritmo acelerado, estabeleceram-se conexões mais estáveis e efetivas entre as diversas regiões. Estabeleceu-se também uma hierarquia entre elas, determinada pelo grau de desenvolvimento econômico, com o topo ocupado pelo Sudeste, o Sul e parte do Centro-Oeste, conjunto geográfico batizado por Milton Santos como Região Concentrada.
Em virtude disso, a construção de um projeto nacional de desenvolvimento, ao mesmo tempo em que deve focalizar uma inserção bem-sucedida do país no ambiente competitivo internacional, precisa pautar a superação das graves distorções legadas por nosso processo histórico, sobretudo as desigualdades sociais e regionais.
Apesar da crise atual, que assombra o mundo inteiro e também nos atinge, as condições para a retomada entre nós de um debate equilibrado acerca do crescimento econômico são amplamente favoráveis, por três razões principais: a) a queda das exportações, o recente recuo do PIB e a retração abrupta da atividade industrial mudaram a agenda do país, até há pouco refém do medo da inflação, e agora centrada nas questões relativas ao desenvolvimento; b) a recriação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), em 2007, além da Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sudeco), no início deste ano, aponta para um comprometimento maior do Estado brasileiro com o desenvolvimento de cada região e a diminuição das disparidades entre as regiões brasileiras; c) o debate especializado em desenvolvimento regional, de um modo geral, enfatiza a necessidade de combinar crescimento econômico com inclusão social.
No que se refere especificamente à Região Centro-Oeste, é preciso combinar a história de sucesso do setor agropecuário com iniciativas consistentes voltadas à expansão dos serviços e da indústria, em especial os empreendimentos intensivos em mão de obra e ambientalmente sustentáveis.
O incremento econômico da região terá impacto significativo na oferta de emprego e exigirá do Estado investimentos de porte voltados à oferta de serviços públicos. Esse conjunto de iniciativas reduzirá, inevitavelmente, as graves discrepâncias intra-regionais hoje existentes entre as áreas mais e as menos prósperas.
Para o Distrito Federal, é crucial o êxito de uma estratégia regional de desenvolvimento. Ela implicará sensível diminuição da pressão demográfica sobre Brasília e toda a área do Entorno; além disso, o aumento dos investimentos públicos e privados na região atuará como fator de ampliação da oferta de bens e serviços para o DF e, inversamente, resultará na expansão do mercado consumidor para a produção local.
Desenvolvimento e integração são hoje aspectos distintos de um mesmo fenômeno: desenvolvem-se e integram-se os países do mundo inteiro, de um continente, de um subcontinente; desenvolvem-se e integram-se regiões. No plano internacional, cabe ao Brasil interagir sem descuidar de seus interesses e sua identidade; no plano inter-regional, continuamos a existir como distintos brasis, cuja diversidade cultural convém celebrar e fruir; quanto às gritantes desigualdades socioeconômicas, cabe superá-las num projeto nacional de cidadania e prosperidade.